04 outubro 2009

A Vida dos Outros

Tenho mania de encarar os livros de duas maneiras: ora são estórias que, durante o período de leitura, se confundirão com a minha; ora enquanto dados ditos importantes para, digamos, um aprendizado. Adentrar nesse universo construído em via dupla, a de quem escreve e a do leitor, é sem dúvida um caminho cheio de novidades. Pois bem, foi dentro de tal perspectiva que me deparei com Persépolis, livro da iraniana Marjane Satrapi, que retrata portanto suas verdades sobre a construção da história de sua nação.



É sempre, no mínimo, muito curioso se deparar com o outro: primeiro vem a estranheza, seguida da desconstrução das verdades que se carrega, para que logo após – diante da consciência da ignorância como ponto de partida – se conheça a cultura, o outro “eu”. Lendo tal obra deparei-me com a vida em quadrinhos de uma menina que cresceu num mundo um tanto quanto oposto à minha realidade, numa distância não somente física, mas principalmente cultural.

Aqui, enquanto mulher, nordestina, brasileira e terceiro mundista, americana e ocidental, vi e aprendi sobre a luta feminina em busca de emancipação, direitos e liberdade (desde o direito de se negar a fazer sexo com seu marido - sendo então considerada tal situação como estupro - até à participação no campo político, econômico e cultural), e as lutas apresentadas por Satrapi em sua vida de costumes orientais.

Diante disso pude então ver o quão contrários foram os movimentos de mudança nas vidas das mulheres ocidentais e orientais (primando aqui por um oriente islâmico, principalmente). No primeiro caso percebe-se que desde os tempos mais remotos até a atualidade a coisa flui de forma a uma evolução direcionada mais para a liberdade e autonomia feminina. Vê-se isto tomando como ponto de partida a Grécia – onde as mulheres não tinham o espaço para a fala, pois pensava-se que as mesmas não teriam capacidade para tanto -, e dando um salto para chamada Idade Média, onde foi extremamente subjugada pelos preceitos cristãos e enfim os séculos XIX e XX, campo de manifestos e movimentos libertários, se assim pudermos classificar.
Já diante do mundo oriental – é importante ressaltar ser esse um olhar de alguém de cultura diferente e bastante distante da analisada – percebo um movimento contrário. O feminino era respeitado até mesmo no âmbito religioso, onde representava dentre outras qualidades a fertilidade do solo além da prosperidade na figura de deusas; o que é oposto ao que ocorreu no ocidente, o feminino foi extremamente discriminado sendo visto como algo que maculava a integridade dos homens ou até mesmo da sociedade como todo. E com as derrubadas e instaurações de poder, baseado nos quadrinhos de Satrapi, vemos como as mulheres perderam o pouco espaço que tinham.

Um momento que retrata essa situação é quando os meninos são separados das meninas, que passam a ser obrigadas a utilizar o véu. Outro ponto é quando a própria mídia televisiva alerta sobre os direitos que os homens têm em atacar mulheres que não usem o véu corretamente. Mas é também interessante notar as formas de reação das mesmas diante daquelas regras islâmicas, justificadas pela guerra travada contra o Iraque, tanto no privado quando realizam festas mesmo sendo proibido quanto no público sendo aqui bastante discreta. São indivíduos que tiveram contato com elementos da cultura ocidental, lembrando da existência de escolas francesas e a partir do regime comandado pelo Islã são invadidos até mesmo em sua vida privada.

É interessante ver como o sentimento de estranheza torna-se um ponto em comum entre eu e Marjane, nos determinados momentos em que ambas se deparam com a vida da outra. Me sinto extremamente feliz em ter acesso aos saberes daquele mundo ainda tão ignorado por nós, principalmente quando se trata da fala de um alguém que vivencia todo o seu universo. É um exercício em que não se deve ter descanso, se abrir de forma verdadeira e receptiva ao outro, nos despojar de nossas verdades tão pretensiosas e a partir daí construir outra visão de maneira mais justa, mais verdadeira.

Laís Medeiros

16 comentários:

  1. trecho de "Somos todos cristãos", de Reinaldo Azevedo, fala sobre as mulheres

    Quando, no começo deste mês, arqueólogos do Vaticano desenterraram o sarcófago com os restos mortais do apóstolo Paulo, nascido no ano 10 e decapitado em 67, vinham à luz alguns séculos de civilização, de que a mensagem de Cristo é, a um só tempo, conseqüência e causa. Combatido, submetido ao obscurantismo politicamente correto e tomado como inimigo das minorias multiculturalistas – tão mais barulhentas quanto mais minoritárias –, o cristianismo, não obstante, guarda as chaves do humanismo moderno e da democracia e constitui o que o homem tem produzido de melhor em pluralismo, tolerância e, creiam!, avanço científico. “A humanidade produz bíblias e armas, tuberculose e tuberculina (…), constrói igrejas e universidades que as combatem; transforma mosteiros em casernas, mas nas casernas coloca capelães militares“, escreveu o romancista austríaco Robert Musil (1880-1942) em O Homem sem Qualidades. Falamos de uma “civilização” que parece ser a improvável história de um permanente paradoxo. E, no entanto, ela avança, sempre duvidando de si mesma, mergulhada às vezes no horror, mas se recuperando, em seguida, para a maravilha.

    Depois de Jesus, é Paulo que vem à luz como o homem mais importante do cristianismo, verdadeiro fundador da teologia cristã. Com um édito do imperador Constantino, em 313, a seita minoritária, nascida entre judeus da Galiléia, tornava-se uma das religiões do Império Romano. Cessava a perseguição ao cristianismo, e aquele foi um dos marcos da longa marcha que se anuncia acima. Como se operou o milagre? O sociólogo americano Rodney Stark sustenta que uma das raízes da expansão cristã é a caridade – elevada por Paulo à condição de primeira virtude. E a outra são as mulheres. Em The Rise of Christianity: a Sociologist Reconsiders History, Stark, professor de sociologia e religião comparada da Universidade de Washington, lembra que, por volta do ano 200, havia em Roma 131 homens para cada 100 mulheres e 140 para cada 100 na Itália, Ásia Menor e África. O infanticídio de meninas – porque meninas – e de meninos com deficiências era “moralmente aceitável e praticado em todas as classes”. Cristo e o cristianismo santificaram o corpo, fizeram-no bendito, porque morada da alma, cuja imortalidade já havia sido declarada pelos gregos. Cristo inventou o ser humano intransitivo, que não depende de nenhuma condição ou qualidade para integrar a irmandade universal. As mulheres, por razões até muito práticas, gostaram.

    No casamento cristão, que é indissolúvel, as obrigações do marido, observa Stark, não são menores do que as das mulheres. A unidade da família é garantida com a proibição do divórcio, do incesto, da infidelidade conjugal, da poligamia e do aborto, a principal causa, então, da morte de mulheres em idade fértil. A pauta do feminismo radical se volta hoje contra as interdições cristãs que ajudaram a formar a família, a propagar a fé e a proteger as mulheres da morte e da sujeição. Embora a cultura helênica, grega, matriz espiritual do Império Romano, tenha sido fundamental na expansão do cristianismo, o mundo estava diante de uma nova moral. Quando Constantino assina o Édito de Milão, a religião dos doze apóstolos já somava 6 milhões de pessoas.

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  2. Stark demonstra ser equivocada a tese de que aquela era uma religião apenas dos humildes. O “cristianismo proletário” serve ao proselitismo, mas não à verdade. A nova doutrina logo ganhou adeptos entre as classes educadas. Provam-no os primeiros textos escritos por cristãos, com claro domínio da especulação filosófica. Mas não só. Se o cristianismo era uma religião talhada para os escravos – “os pobres rezarão enquanto os ricos se divertem” (em inglês, dá um bom trocadilho: “the poor will pray while the rich play“) –, Stark prova que o novo credo trazia uma resposta à grande questão filosófica posta até então: a vitória sobre a morte.

    Outro mito diz respeito a um suposto cristianismo pastoril e antiurbano. Nos primeiros séculos, ao contrário, a fé se espalhou justamente nas cidades. Um caso ilustra bem o motivo. Entre 165 e 180, a peste mata, no curso de quinze anos, praticamente um terço da população do império, incluindo o imperador Marco Aurélio – o filme Gladiador mente ao acusar seu filho e sucessor, Cômodo, de tê-lo assassinado. Outra epidemia, em 251, provavelmente de sarampo, também mata às pencas. Segundo Stark, amor ao próximo, misericórdia e compaixão fizeram com que a taxa de sobrevivência entre os cristãos fosse maior do que entre os pagãos. Mais: aqueles acreditavam no dogma da Cruz e, pois, na redenção que sucede ao sofrimento. O ambiente miserável das cidades, de fato, contribuía para a pregação da fraternidade universal: os cristãos são os inventores da rede de solidariedade social, especialmente quando começaram a contar com a ajuda de adeptos endinheirados e, nas palavras de Stark, “revitalizaram a vida nas cidades greco-romanas”. Os cristãos inventaram as ONGs – as sérias. Essa dimensão do cristianismo, que só pode existir se vivenciada na prática, está em Paulo. Hora de voltar a ele.

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  3. “POR QUE ME PERSEGUES?”
    Foi em Antioquia (At, 11: 26), na Síria, que uma comunidade, pela primeira vez, designou-se “cristã”, justamente os convertidos de origem pagã. E é dali que o cristianismo se espalhou pelo antigo mundo helênico, então romanizado. Em At, 11:1-3, São Pedro, considerado o fundador da Igreja, é censurado por seus pares: “Entraste na casa de homens não circuncidados e comeste com eles”. Pedro responde que o fez por inspiração divina. O momento em que o cristianismo deixa de ser o credo de um grupo minoritário de judeus da Palestina para ser a religião de todo e qualquer homem “que aceite a salvação” tem um símbolo: a conversão de Saul, que aparece como “Saulo” nas versões em português da Bíblia.

    Ele houvera recebido a incumbência de ir a Damasco e conduzir presos a Jerusalém “quantos encontrasse daquela profissão” (os cristãos). Na estrada, “cercou-o uma luz vinda do Céu. E, caindo em terra, ouvia uma voz que lhe dizia: ‘Saul, Saul, por que me persegues?’. Ele disse: ‘Quem és tu, Senhor?’. E Ele lhe respondeu: ‘Eu sou Jesus, a quem tu persegues’” (At, 9: 3-5). Em Damasco, aonde fora conduzido cego, Saul recebeu Ananias, um convertido, que o curou pela imposição das mãos, inspirado por Jesus. O Filho de Deus vê em Saul “um vaso escolhido” para levar o seu nome “diante das gentes, e dos reis, e dos filhos de Israel” (At, 9:15). Nascia, assim, o Apóstolo dos Gentios, cujo nome cristão passa a ser “Paulo”. E nascia o cristianismo como religião universal.

    Coube a esse fariseu convertido romper os laços com a tradição judaica. O batismo mimetizaria a própria morte e ressurreição de Cristo. Por meio dele, morria-se para o passado e nascia-se para uma nova vida. Na Primeira Epístola aos Coríntios, escreve: “Num mesmo espírito fomos batizados todos nós, para sermos um mesmo corpo, sejamos judeus, ou gentios, ou servos, ou livres: e todos temos bebido em um mesmo espírito” (I Cor, 12:13). Paulo dá ordenamento à mensagem de fraternidade universal de Cristo e antevê a comunidade dos homens não mais separados por credo, raça ou, note-se, história pessoal. Junto com o batismo, está a eucaristia: “Porventura o cálice da bênção não é a comunhão do sangue de Cristo? E o pão não é participação do corpo do Senhor?” (I Cor, 10:16).

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  4. Paulo está para o cristianismo como Maquiavel para o realismo político. Se conferia dimensão mística à coletividade, era o profeta da Graça divina tornada uma rebelião individual: a redenção se dá por meio da fé. Se ele recomenda, em Rom, 13:7, que os impostos sejam pagos, o imperativo da fé traz a semente de uma subversão. Segundo ele, só por meio da lei (referia-se à lei divina), ninguém se justifica diante de Deus. Paulo foi um gênio político, e suas escolhas determinaram a capacidade do cristianismo de se adaptar aos desafios que lhe são contemporâneos sem abrir mão dos princípios. Sua teologia está centrada na certeza da ressurreição, que prova a divindade do Cristo. Por isso, é também o mensageiro da parúsia, da segunda vinda do Messias. Mas o que fazer enquanto Ele não volta?

    A parúsia devia gerar uma espera angustiada e frustrada. Cumpria ordenar a vida dos cristãos. Na Segunda Epístola aos Tessalonicenses, ele recomenda: “Não comemos de graça o pão, mas com nosso trabalho e fadiga. (…) se alguém não quer trabalhar, não coma” (2 Tes, 3:7-10). Antes de Milton Friedman, Paulo já sabia que não existe almoço grátis. Nem salvação. As religiões não cristãs da Antiguidade davam grande ênfase ao “entusiasmo”, ao arrebatamento religioso. Ele se dirige aos Coríntios e estabelece uma hierarquia no que chama “corpo místico de Cristo”: “Se eu falar a língua dos homens e dos anjos e não tiver caridade, sou como o metal que soa (…). E se eu tiver o dom da profecia e conhecer todos os mistérios (…) e se tiver toda a fé (…), e não tiver caridade, não sou nada” (Cor, 13:1,2). Preparava os cristãos para uma corrida de fôlego. E lembrava que o cristianismo supõe mais do que uma espera.

    Cristo voltará à terra. Um dia. Os cristãos não renunciaram à parúsia. Mas os contemporâneos, notadamente os católicos e os protestantes históricos, tendem a considerar que o acontecimento escatológico, finalista, de certo modo, já aconteceu. A luta final do Bem contra o Mal perdeu seu acento místico e seu caráter temporal para ser uma espera simbólica. Esse Cristo laicizado está prenunciado no próprio Paulo. Como demonstra Stark, o cristianismo se consolida nas cidades greco-romanas como religião da solidariedade. E, modernamente, com certo risco para o próprio credo, vê mitigada a sua dimensão sagrada para se transformar num código civil, íntimo das sociedades democráticas. A Igreja dos Gentios se torna uma comunidade em favor da universalização de direitos.

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  5. OCIDENTE GRECO-CRISTÃO
    Cristo e o cristianismo seguem como as principais referências da civilização ocidental. De tal sorte é assim, que nem pensamos nisso. Culturas vitoriosas são estáveis, pacíficas, civilistas e até um tanto frívolas na proteção dos seus fundamentos. Quem viu o papa Bento XVI, na Turquia, orando como oram os muçulmanos assistiu à presença serena de um pastor que não duvida da natureza inclusiva do seu credo. O cristianismo, na sua manifestação mais poderosa, a Igreja Católica – 1,098 bilhão de pessoas, segundo o Anuário Pontifício de 2006 –, voltava a Paulo. Se não mais para converter, para compreender. Estima-se que um terço da humanidade – 2,1 bilhões de pessoas – seja cristão.

    É claro que o que vai acima se presta ao contencioso. Especialmente num tempo em que toda evidência serve à contestação. As culturas vitoriosas dão à luz os críticos de seus próprios fundamentos. É a melhor evidência de um triunfo. Assim, haveria ali a indisfarçável afirmação da supremacia de uma visão de mundo. Cristo é e seguirá sendo a principal referência do que reconhecemos no Ocidente como a nossa “cultura” porque somos todos cristãos. Se não formos pela fé, seremos pela história; se não formos porque devotos da Revelação, seremos porque caudatários de uma revolução. Cristãos, ateus, judeus, islâmicos, budistas, materialistas, espíritas, agnósticos, comungamos de um patrimônio que entendemos como um ideal de civilização e de justiça.

    Se o cristianismo conferiu uma ética nova, como se viu, à cultura greco-romana, tomou dela emprestados alguns séculos de especulação filosófica. De sorte que se constituiu, no tempo, como a memória de dois humanismos, de duas visões totalizantes: a helênica – grega – e a dos Evangelhos. Apostamos nas virtudes do exame de consciência; estamos ocupados em controlar nossos impulsos para ser reconhecidos como pessoas a serviço do bem e da verdade; esforçamo-nos para demonstrar que preferimos ser colhidos pela injustiça a praticá-la; aspiramos a valores espirituais acima dos materiais e apreciamos tal qualidade nos outros; boa parte de nós acredita numa justiça divina que sucede à morte, e os que não chegam a tanto demonstram seguir um modelo perfeito ao menos na idéia. Somos, de fato, não só cristãos, mas também herdeiros involuntários do filósofo grego Platão (428-348 a.C.). E onde essas idéias não se transformaram em leis, em códigos leigos, o poder se impõe pelo terror, pela ditadura, pela violência institucionalizada, pela morte – e, freqüentemente, assim se procede “em nome de Deus”. Não há humanismo leigo que tenha sido tão poderoso na história humana quanto três palavras que salvam: consciência, arrependimento e perdão.

    A referência a Platão ilumina o debate. Se, do ponto de vista da origem histórica, faz sentido falar em um mundo “judaico-cristão”, no que concerne à religião e à filosofia, o que ganhou o mundo foi o helenismo cristão. O Império Romano helenizado havia abolido as fronteiras, estimulado a especulação filosófica, reconhecido a cidadania dos povos conquistados, estabelecido o ideal – e só o ideal – de uma humanidade fraterna, com a qual sonhavam os filósofos.

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  6. Richard Tarnas, autor de A Epopéia do Pensamento Ocidental, nota que a abertura do Evangelho de João – “No princípio era o Verbo” – remete ao “logos universal da filosofia grega”, isto é, a uma espécie de inteligência cósmica, que “transcendia todas as oposições e imperfeições aparentes”. Isso pressupunha a existência de uma Razão, de um cosmo universal, potencialmente alcançável por qualquer homem, independentemente de sua origem. O judeu Fílon de Alexandria, que nasceu entre os anos 15 e 10 a.C. – contemporâneo de Jesus e de Paulo –, falava de uma certa “idéia das idéias”, fonte da inteligibilidade do mundo. Sem Alexandre Magno (356-323 a.C.), educado pelo filósofo Aristóteles (384-322 a.C.), e o Império Romano, com a sua paz duradoura, talvez o cristianismo tivesse ficado restrito à Galiléia. Não faz sentido contar a história que não houve, mas é preciso que nos coloquemos uma questão: por que a doutrina se difundiu e se tornou hegemônica além das fronteiras da Palestina sem que tenha, em sua própria terra de origem, suplantado o judaísmo, de onde derivou?

    Os primeiros cristãos de Jerusalém, nota o historiador romeno naturalizado americano Mircea Eliade (1907-1986) em História das Crenças e das Idéias Religiosas, eram judeus de Jerusalém que “constituíam uma seita apocalíptica dentro do judaísmo palestino”. Eles “estavam na espera iminente da segunda vinda do Cristo”. A ekklesía (termo grego que designa igreja) cristã nasce no Dia de Pentecostes. Em Atos dos Apóstolos, lemos que os discípulos de Jesus estavam reunidos quando, “de repente, veio do Céu um estrondo (…) e lhe apareceram umas línguas de fogo, e pousou uma sobre cada um deles (…) e começaram a falar em várias línguas” (At, 2: 1-4). Pedro então conclama os varões de Israel à conversão: “Saiba logo toda a Casa de Israel, com a maior certeza, que Deus o fez não só Senhor, mas também Cristo a este Jesus” (At, 2:36). Khristós, em grego, significa “o Ungido”, o “Messias”.

    O Pentecostes era uma festa religiosa dos judeus, inicialmente ligada à colheita e depois à entrega da Tábua das Leis no Monte Sinai. O início da igreja cristã assiste, como se vê, a uma manifestação análoga àquela fundadora para o judaísmo: segue a tradição mosaica – do patriarca Moisés –, embora a hierarquia religiosa judaica fosse hostil aos apóstolos. Uma hostilidade que era menor contra os hebreus locais do que contra os judeus “helenistas”.

    Os Atos relatam intrigas e falsos testemunhos contra inocentes acusados de blasfêmia. Ainda que as imputações fossem falsas, a verdade é que os cristãos helenistas resistem à herança rabínica do cristianismo da Palestina. Santo Estêvão, primeiro mártir da religião, desafia a hierarquia ao negar que Deus precisasse de um templo: “Mas Salomão lhe [a Deus] edificou a casa. Porém, o Excelso não habita em casas feitas por mãos humanas, como diz o profeta” (At, 7: 47-48). Ele é martirizado e tem início uma grande “perseguição à Igreja”. Em At, 8:3, está presente o grande artífice do cristianismo, mas ainda como inimigo dos cristãos: Paulo, protagonista desta história.

    O cristianismo como uma ética das relações foi, sustenta Rodney Stark, um dos fatores de seu enraizamento na Antiguidade e de sua expansão em todas as classes e grupos sociais, com especial ênfase entre as mulheres. Se a visão de mundo cristã não era avessa ao “logos” grego, como aqui se escreveu, emprestava à família um acento estranho àquela cultura, o que foi logo percebido pelas mulheres. Elas, como sói acontecer, identificaram primeiro o amor de salvação.

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  7. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    aí não laisinha, fosse eu me retava!
    o cara é muito sem noção!

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  8. Que comentário nada a ver. Antes tivesse colocado o link do texto, que nem fizeram no outro post. Quem quisesse entrar que fosse lá...

    Tipo, os posts têm limite de tamanho já porque ninguém lê nada grande de mais em blogs... Quem vai ler isso?

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  9. Deixa ver se eu peguei o ponto: Dimitri acha que Laís está se masturbando?

    Sim ou não, o texto dela é bem construído e divertido de ler - sem falar que ela é linda! É claro, isto não melhora a qualidade do texto. Nem precisa, eu gostaria desse texto mesmo que o Stephen Hawking o tivesse escrito (e ele é muito feio!)

    O mundo Oriental é uma lacuna para todos nós, como registra a impressão da autora do texto. Um mundo desconhecido com pessoas desconhecidas, mas ainda humanas. Quero dizer que as emoções humanas são as mesmas por toda a parte. Variamos as roupas e o cenário. Mas compartilhamos medo, angústia, dor, curiosidade, compaixão, inveja e contentamento. SER humano, portanto, significa... ah, é preciso refinada psicologia para compreender as motivações das pessoas! (Shakespeare é o ídolo de todos neste quesito, não?)

    Regras sociais diferentes. Contudo, os critérios, as motivações, a psicologia mais íntima, os instintos... são os mesmos! As pessoas (e sociedades) querem o mesmo, mas seguem estratégias diferentes.

    [Por exemplo. Eu fico pensando se chico buarque ou os Rolling Stones vão parar no Paraíso ou no inferno? Ok, já decidi para onde eu quero ir!]

    P.S.Estou com a sensação de que eu vou precisar desenhar para que "determinados" leitores deste blog consigam entender o exemplo e a piada.

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  10. Concordo com Paulo, comentemos o texto da vez. Quem quiser postar seus textos no blog devem enviar aos editores do mesmo para serem revisados e posteriomente publicados, ou não. Apesar de ser uma história em quadrinhos (filme), sem dúvidas Persépolis traz muitas informações relevantes sobre a história do Irã para quem ,assim como eu, não conhecia.

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  11. uiliam, soh me desconfortei com o "APESAR, de ser historia em quadrinho (filme)" mas tudo bem

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  12. Pra quem não viu, Uilião respondeu no Orkut de Cabelo que os quadrinhos costumam ser fictícios, justificando o "apesar" que o desconfortou.

    Mas há quadrinhos e quadrinhos. Há HQs bem celebradas na área de não-ficção, mesmo entre críticos literários ranzinzas. Maus é o exemplo mais famoso (ganhou um Pulitzer).

    Acredito que as HQs autobiográficas, históricas ou jornalisticas(e estamos repletos de bons exemplos delas) têm mais crédito entre as de não-ficção, pois são, antes de tudo, obras autônomas. Fica difícil fazer em quadrinhos uma tese sobre radiação, por exemplo, sem soar pedante ou didático demais. As HQs são, antes de tudo, para narrações, mesmo considerando as HQs didáticas. Se elas têm potencial para ensinar coisas como matemática ou biologia, ele ainda não foi desenvolvido. Quem quiser estudar sobre a radiação é só pegar o livro de ciências. Uma mídia não elimina a outra, como muita gente (leitores de livros que abominam as HQs e vice-versa) parece pensar.

    Por isso este "apesar" ao se referir às HQs é uma generalização desconfortante. Não falo do comentário de Uilião, pois ele mesmo afirma o interesse na obra, mas do público em geral. O "apesar" retoma a idéia bastante difundida de que as HQs não têm crédito o suficiente para falar de um assunto com propriedade. Se assim ocorre, não é porque a mídia é insuficiente para isso, mas porque a maioria das pessoas acreditam que seja. E ainda assim, depende do assunto e depende da HQ. Certamente não há tantas boas HQs sobre o Irã como há livros. Mas, como bem disse Uilião, Persépolis é.

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  13. ...É sempre, no mínimo, muito curioso se deparar com o outro: primeiro vem a estranheza, seguida da desconstrução das verdades que se carrega, para que logo após – diante da consciência da ignorância como ponto de partida – se conheça a cultura, o outro “eu”...

    Essa parte do texto, quem nunca viveu? Na verdade vivemos assim o tempo todo. Todos temos pré-julgamentos - alguns bons, outros não. Muitos acertam, mas a maioria erram... Bom mesmo é viver aberto ao outro "eu" estando disposto a passar pelo processo de aceitação -árduo processo para muitos-.

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  14. Aliás... a sociedade é hipócrita mesmo.

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