Vamos falar de textos chatos. Eu, Rodolfo Carneiro, jovem adepto deste artifício, alvo de risadinhas desconcertantes dos editores sérios deste blog, reconheço, espontaneamente, ser um chato militante – não um militante chato. Tudo tem limite. E se isto pareceu uma introdução legal, não se enganem. Pegar-vos-ei com as calças na mão.
Para minha remoída tristeza, meus escritos não são tão bons quanto são maçantes. Isto não significa que devo me tornar agradável, pensar no leitor, ser compreensivo e plantar uma árvore. Tenho é que apurar a coerência dos argumentos, a relevância do tema e o mais importante, o número de marias-dicionário que ludibriarei com estas estórias. A chatice está no caminho certo.
Não vou tomar vosso tempo... Melhor. Vou tomar vosso tempo com um dos refinamentos desta arte. Nada mais chato nesta circunstância que um marco teórico, um argumento de autoridade para justificar este post. Pois bem, segundo Pierre Bourdieu:
“[...] o que é complexo só se pode dizer de modo complexo. [...] Não há dúvidas que não procuro discursos simples e claros e que acho perigosa a estratégia que consiste em abandonar o rigor do vocabulário técnico em favor de um estilo legível e fácil. [...] A falsa clareza é com freqüência obra do discurso dominante, o discurso daqueles que acham que tudo é óbvio, porque tudo está bem como está. [...] É preciso assumir que o discurso pode e deve ser tão complicado quanto exige o problema tratado. Se as pessoas pelo menos retêm que é complicado, isto já é um aprendizado. Além disto, não acredito nas virtudes do “bom senso” e da “clareza”. [...] é preciso nos empenhar para empregar as palavras de tal maneira que elas não digam outra coisa se não o que quis dizer, percebe-se que a melhor maneira de falar claramente consiste em falar de modo complicado, para tentar transmitir ao mesmo tempo o que se diz e a relação que se mantém com o que se diz, e evitar dizer à revelia mais coisas e coisas diferentes daquilo que se acreditou dizer. [...]”
E pra não ser acusado de argumentador de mão única, termino com Douglas Adams: O universo (ou é o infinito) é chato. Nos dois sentidos da palavra.
Se a gente desconsiderar a chatice insuportável do Pierre Bourdieu, este foi o melhor texto de Rodolfo.
ResponderExcluirSei lá, eu gostei de ler.
Ah, claro: Não quer dizer que eu concordo!
ResponderExcluirComentário chato: cadê a referência de Bourdieu?
ResponderExcluir"A melhor maneira de falar claramente consiste em falar de modo complicado". Quase um paradoxo.
Rodolfo alega que esses textos legais não vão ser padrão. Esse, só porque não diz nada, ficou bom. Pelo menos desta vez dá pra comentar o texto e não o comentário...
O seu estilo é bom, meu caro. Agradável de se ler. A militância é que são outras. E busque a simplicidade, verá como é o caminho mais indicado para explanar sobre o complexo.
ResponderExcluirBom, se o que se quer é ludibriar marias-dicionarios está no caminho certo.
ResponderExcluirO texto é bom o que, assim como juliano postou logo ali, não quer dizer que concorde.
Depende de para quem se quer escrever.
esquece o complexo vei, da pra comer marias-dicionario com menos que isso!
ResponderExcluirConcordo com Juliano quando diz que desconsiderando a chatice de Bourdieu esse foi o melhor texto de Rodolfo, fico feliz por ele não ter pretensões literárias. Só estou refletindo mais demoradamente sobre a questão “de marias-dicionário que ludibriarei com estas estórias”.
ResponderExcluirPois é minha amiga, abre mais esse teu olho...
ResponderExcluirpq ou vc vai rodar ou vc está inserida nessa realidade.=x
É Rodolfão, o bicho ta pegando pro seu lado aqui...
ResponderExcluirConcluir com Douglas Adams foi genial.
ResponderExcluirCom um retardo de quase sete anos, mas tempestivamente (afinal, como diria Gandalf, "Um mago nunca se atrasa, Frodo Bolseiro, e nem se adianta. Ele chega exatamente na hora que quer"), venho em socorro de Rodolfo para, com esteio nos citados trechos de Bourdieu, reiterar a assertiva de que " [...] é preciso nos empenhar para empregar as palavras de tal maneira que elas não digam outra coisa se não o que quis dizer [...]".
ResponderExcluirSeguindo nesta senda, há de se considerar a complexidade da lingua portuguesa, a enorme gama de palavras sinônimas umas das outras que a compõe e a ainda maior multiplicidade de significados que podem ser empregados a cada um dos sinônimos conforme o contexto em que se encontrem.
Desta forma é que, a fim de se evitar desentendimentos e transmitir o mais fidedignamente possível a ideia que se quer comunicar, é necessário, ata-la, limita-la e molda-la por meio das mais variadas expressões, de modo que as idiossincrasias do interlocutor a quem nos dirigimos não a deforme e aperceba de modo distinto do pretendido.
A simplicidade pode ocasionar desentendimentos, ,senão vejamos: Ao se enunciar que "o céu é azul", múltiplas interpretações podem derivar desta assertiva. i) Que a camada atmosférica que circunda o globo terrestre, ao refratar a luz solar na região dos trópicos tem uma tonalidade azulada; ii) que o "paraíso celestial", constante de um sem fim de credos, é caracteristicamente azulado; ii) que os pedaços do firmamento que não estejam preenchidos com nuvens devem tem coloração azulada; iv) que é uma flagrante mentira ou equívoco se o interlocutor mira um céu noturno ou polar, etc.
Por outro lado, a adoção de sentenças mais específicas como as dos três primeiros exemplos assegurariam a certeza (ou ao menos diminuiriam a margem de discricionariedade interpretativa do interlocutor) da mensagem transmitida.
Enfim, pela extensão que já toma este comentário (injustificável ainda que frente ao tantos anos de mora), finalizo por dizer que tudo quanto foi dito só ilustra a relevância de certo grau de complexidade do discurso a fim de assegurar verossimilhança na informação que se pretende transmitir.
Se por algum meio não vos consegui fazer vislumbrar nosso ponto de vista, é porque pequei pela simplicidade e não fui suficientemente complexo em minha explanação de modo a satisfazer a complexidade do tema.