29 abril 2010

O espetáculo da verdade

Para quem é feita a ciência? Este conhecimento recente que arrebatou o imaginário popular decerto não possui um caráter per se, alicerçado no ato puro do conhecer. Se porventura outrora houve este dia, nós apreciamos ainda a pouco o seu crepúsculo. Não há mais lugar para aquele inusitado senhor genioso e seus cabelos esvoaçados. A institucionalização da ciência, coisa nova, trancafiou a indagação dentro do laboratório - e como tudo que valha a pena, o laboratório tem um dono.


O mundo é um lugar grande, como dizia meu amigo: “até Saturno faz parte do mundo”. Como estudar esta coisa desmedida que vai de Saturno até às mitocôndrias? Não dá. Apenas algumas frações da realidade podem ser problematizadas, isso para aqueles que acreditam que a realidade é uma coisa vagando por ai e que pode ser decomposta em partes – por incrível que pareça, hoje, a realidade é coisa do passado. O critério que seleciona o estudo das partes é a utilidade do conhecimento produzido por este mesmo estudo. Juliano meu primo que o diga, não foi aprovado no mestrado porque seu conhecimento, aos olhos dos capacitados examinadores, não lhes pareceu útil o suficiente.

O útil é uma categoria abstrata, moral e, definitivamente, não é uma ciência exata. Pode ser um útil utilitário, baseado em estatísticas que prevêem o desenvolvimento de necessidades estratégicas, pode ser coletivo, pode ser autoritário e até inútil. Em todas estas hipóteses, o útil é sempre útil para alguém.

A ciência, enquanto um conhecimento justificado em si mesmo, pressupõe uma utilidade voltada pra si, o aprofundamento constante daquilo que se propõe conhecer. No entanto, hoje, o útil na ciência - que é o do laboratório que têm um dono, o Estado ou algum sujeito alemão – é alinhado aos interesses deste proprietário.

Daqui em diante parecerei um dinossauro marxista...

O dono do laboratório é constrangido por uma ordem social, por isso mesmo, sua percepção de utilidade emerge segundo a natureza destas estruturas. O estatuto desta ordem é a reprodução do capital. Apesar da latente tentação, não rodearemos a natureza deste processo, o que não exime a constante urgência de apreciarmos criticamente este cenário. O que nos interessa aqui é como a brancura dos jalecos está sendo maculada no devir desta estória.

Pra que serve a psicologia, pra definir os padrões de normalidade de quem pode trabalhar ou não; pra que serve a física e a química, pra fazer vídeo game; pra que serve a ciências sociais, pra medir as formas de aprofundar a circulação do capital; pra que serve o direito, pra manter tudo como é. As ciências, na forma específica da tecnologia, são úteis ao Capital. É para ele que ofertamos este nosso labor.

Toda prática científica é apaixonada, o que não ofusca o papel edificante deste conhecimento, os seus frutos úteis. Mas há uma diferença entre ciência e cientificismo, este último amplamente divulgado como a religião da modernidade. Nesta condição de cientificismo, o conhecimento científico torna-se um acessório da manutenção do poder, sua capacidade de legitimar discurso em verdades a torna útil para abafar as posições marginais segundo os interesses do centro. A ciência não indica caminhos, ela descreve, cataloga, explica, mas não indica caminhos, isso porque não existe um fim inexorável para o qual tenhamos que caminhar. Todo fim é uma construção moral e a cientificidade, enquanto um maquinário, com um dono, que se propõe descobrir um fim último, uma organização correta da vida, verdadeira, termina por se transformar, de instrumento emancipador do gênero humano, se assim desejássemos ter um, para um artefato de opressão invisível.

Rodolfo Carneiro

22 comentários:

  1. Estranho! O número de acessos está elevado, e no entanto tão poucos comentários...

    ¬¬

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  2. a falta de comentario se dar por ausencia de identificação pessoal com as postagens...
    enquanto ao texto acima aí, é impressão minha ou nele sugere que a ciencia seja fundamentada em alguns dogmas!?

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  3. O conhecimento, havemos de convir, nunca foi barato. Convenhamos também que fomos nós que optamos por uma sociedade capitalista. Logo, aliando estas duas premissas, concluímos que o conhecimento pelo conhecimento não é economicamente viável, há de ter um retorno financeiro, não mínimo ou razoável, mas o máximo possível. Por isso temos videogaimes com tecnologia de ponta enquanto não somos capazes de extirpar o câncer. Videogaimes vendem mais.
    Quem se importa se há vida em outro planeta se não pudermos fazer dela uma mão de obra barata? Tanto menos nos interessa se forem formas de vida inteligente, pois são mais difíceis de se oprimir, provavelmente reclamariam seus direitos trabalhistas.
    Para que perder tempo e (principalmente) dinheiro em produtos biodegradáveis, construções ecologicamente corretas, quando armas de destruição em massa rendem milhões a mais?
    E definitivamente, porque diabos alguém iria querer acabar com a marginalidade, as favelas, a degradação humana, quando o tráfico rende tão bem?
    Não. A ciência tem que se prestar a um fim. Econômico que seja, mas um fim. Saber por saber, conhecimento pura e simplesmente, sem aplicabilidade não possui espaço em nosso mundo. Mas incrivelmente todos conhecem o final da novela das oito.

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  4. existem tambem as academias artisticas.
    alguem pergunta a laio pra que q serve a faculdade dele?
    pq eu nao faço iedia pra que sirva a minha!
    servir, que eu digo, eh compartilhando o conceito utilitario!

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  5. Algo me diz que a cura do câncer venderia muito, muito mais do que videogames.

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  6. oi prof tudo bom com o Senhor? lhe add no meu email.
    seja bem vindo.

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  7. Ju, lamento discordar, mas, se a cura do câncer desse mesmo dinheiro, a Nitendo estaria investindo nela e não em controles sem fio, não acha?

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  8. Depois de ler o texto e seus comentários, descobri que deveria iniciar todos os meus, bem como assinar cada um deles com: Discordo.

    Rodolfo,

    Primeiramente, gostei desta sua potencial tradução do que é e para o quê se presta a ciência. Mesmo assim, tenho de discordar de alguns pontos abordados no texto.

    Não penso, por exemplo, que os ‘laboratórios tenham donos’. É bem verdade que há financiadores que precisam de um dado retorno. Este, infelizmente, por vezes é financeiro, mas não é uma regra – um detalhe coerente é que a ‘utilidade’ das descobertas ou suas aprimorações costumam ser financeiramente rentáveis. Mas esta não é uma regra. Os estudos, em seu dado contexto, podem não ter necessariamente um propósito financeiro, enquanto outros o são, e estritamente.

    Explico-me: os campos científicos e suas subáreas beiram a infinitude. Pode-se investir-se em um produto, em específico; ou simplesmente investigar-se uma dada situação ou composto; ou ainda analisar dados já computados, etc. Para análise, levanto dois eventos científicos recentes e estritamente laboratoriais: o Futeboleno e o Viagra.

    O futeboleno (um composto sintético com 60 carbonos de formato tridimensional que lembra uma bola com seus gomos, por isso o ‘futebol’eno) foi sintetizado e estudado durante três décadas, até recentemente descobrir-se uma de suas limitadas utilidades. Até então não se sabia nenhuma de suas aplicabilidades, até descobrir-se uma há pouco tempo, mesmo assim eles continuaram investindo em seu estudo. Do outro lado, o Sildenafil, popularizado como Viagra (a maior concentração deste composto até então descoberta está em plantas nativas da Amozônia, que foram extraídas e cultivas em estufas européias. Depois, adivinhem? Patenteada) mesmo antes de haver sido isolado, já existia uma indústria propagandista que vendia ao mercado o potencial sexual que aquele produto propiciaria.

    De um lado, o futeboleno tem sido usado como veículo de administração de drogas, diminuindo os efeitos colaterais, e pouco alterando o valor final do produto. Enquanto isso, o investimento de meio bilhão na extração do Sildenafil foi recuperado apenas no primeiro trimestre que a droga entrou no mercado. Note, portanto, que nem sempre o fim tem de ser financeiro, pode-se investir-se em ciência pelo avanço exploratório dela – calculadoras existe, ora. Mas é verdade que o dinheiro na maioria das vezes esta por trás dos avanços e justificando-o.

    Mais uma coisa, gostosamente reli o comentário acerca dos propósitos da ciência. Posto que este não reside em compreender tudo, mesmo porque, como bem colocado no texto, beira a impossibilidade, uma vez que é bastante improvável, mesmo estendendo o fator tempo a variáveis astronômicas. Em verdade, a ciência detém-se e propõe explicações que sejam plausíveis e que não somente se apliquem, mas que comprovem as diferentes situações e resultados. Logo, reafirmando, o que temos são frações problematizadas de uma questão em específico e estudos que tentam descritivamente entendê-lo.

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  9. Rhuan,

    Concordo plenamente com você quando diz que ‘o conhecimento é um produto caro’. Mas discordo veementemente quando afirma que se investe mais em videogames do que nas ciências da saúde. Saiba que, em nível mundial, os maiores investimentos setoriais ocorrem na indústria bélica, sendo seguido dos investimentos em saúde (medicamentos, procedimentos, estudos epidemiológicos e recursos humanos). Por isso, definitivamente, videogame não vende mais que sua saúde (câncer).

    Você vai relutar, e pode até dizer que toda a tecnologia digital está por trás de ambas, tanto a bélica quando a de saúde. Aí sim, neste ponto eu posso até concordo. Entretanto, o que ocorre, de fato, é que a informática é utilizada como uma ferramenta, e não como um fim, como ocorre na maioria dos equipamentos de lazer a que você se referia.

    É verdade também quando você diz que não fomos ainda capazes de por um fim ao câncer, mas já avançamos, e muito. É fato que já somos capazes de prolongar a sobrevida dos pacientes, proporcionando nesse meio tempo uma maior qualidade de vida, sem contar que tratamentos como a quimioterapia e a radioterapia tem mostrado uma considerável redução na evolução da doença. Vale ressaltar que comentários semelhantes a estes seus foram ditos acerca da malária e da poliomielite, décadas atrás. Hoje, ambas as doenças estão eliminadas e a OMS (Organização Mundial de Saúde) considera que estas são doenças extintas no planeta.

    Em mais um ponto parece-me que você se equivocou: produtos biodegradáveis. Duvidas mesmo que existam investimentos nessa área? Ora, eles não só tem crescido continuadamente nas últimas décadas como os recursos para pesquisa neste campo têm aumentado vertiginosamente nos últimos anos. Sacolas biodegradáveis, energia geotérmica, casas e asfalto feitos a partir de pneus triturados, créditos de carbono, etc. Tudo isso demanda investimento. Entre dois a dez porcento - variável de acordo com a situação e o PIB de cada país – é alocado em investimentos de pesquisa e extensão.

    ...

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  10. Depois de ler o texto e seus comentários, descobri que deveria iniciar todos os meus, bem como assinar cada um deles com: Discordo.

    Rodolfo,

    Primeiramente, gostei desta sua potencial tradução do que é e para o quê se presta a ciência. Mesmo assim, tenho de discordar de alguns pontos abordados no texto.

    Não penso, por exemplo, que os ‘laboratórios tenham donos’. É bem verdade que há financiadores que precisam de um dado retorno. Este, infelizmente, por vezes é financeiro, mas não é uma regra – um detalhe coerente é que a ‘utilidade’ das descobertas ou suas aprimorações costumam ser financeiramente rentáveis. Mas esta não é uma regra. Os estudos, em seu dado contexto, podem não ter necessariamente um propósito financeiro, enquanto outros o são, e estritamente.

    Explico-me: os campos científicos e suas subáreas beiram a infinitude. Pode-se investir-se em um produto, em específico; ou simplesmente investigar-se uma dada situação ou composto; ou ainda analisar dados já computados, etc. Para análise, levanto dois eventos científicos recentes e estritamente laboratoriais: o Futeboleno e o Viagra.

    O futeboleno (um composto sintético com 60 carbonos de formato tridimensional que lembra uma bola com seus gomos, por isso o ‘futebol’eno) foi sintetizado e estudado durante três décadas, até recentemente descobrir-se uma de suas limitadas utilidades. Até então não se sabia nenhuma de suas aplicabilidades, até descobrir-se uma há pouco tempo, mesmo assim eles continuaram investindo em seu estudo. Do outro lado, o Sildenafil, popularizado como Viagra (a maior concentração deste composto até então descoberta está em plantas nativas da Amozônia, que foram extraídas e cultivas em estufas européias. Depois, adivinhem? Patenteada) mesmo antes de haver sido isolado, já existia uma indústria propagandista que vendia ao mercado o potencial sexual que aquele produto propiciaria.

    De um lado, o futeboleno tem sido usado como veículo de administração de drogas, diminuindo os efeitos colaterais, e pouco alterando o valor final do produto. Enquanto isso, o investimento de meio bilhão na extração do Sildenafil foi recuperado apenas no primeiro trimestre que a droga entrou no mercado. Note, portanto, que nem sempre o fim tem de ser financeiro, pode-se investir-se em ciência pelo avanço exploratório dela – calculadoras existe, ora. Mas é verdade que o dinheiro na maioria das vezes esta por trás dos avanços e justificando-o.

    Mais uma coisa, gostosamente reli o comentário acerca dos propósitos da ciência. Posto que este não reside em compreender tudo, mesmo porque, como bem colocado no texto, beira a impossibilidade, uma vez que é bastante improvável, mesmo estendendo o fator tempo a variáveis astronômicas. Em verdade, a ciência detém-se e propõe explicações que sejam plausíveis e que não somente se apliquem, mas que comprovem as diferentes situações e resultados. Logo, reafirmando, o que temos são frações problematizadas de uma questão em específico e estudos que tentam descritivamente entendê-lo.

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  11. Rhuan,

    Concordo plenamente com você quando diz que ‘o conhecimento é um produto caro’. Mas discordo veementemente quando afirma que se investe mais em videogames do que nas ciências da saúde. Saiba que, em nível mundial, os maiores investimentos setoriais ocorrem na indústria bélica, sendo seguido dos investimentos em saúde (medicamentos, procedimentos, estudos epidemiológicos e recursos humanos). Por isso, definitivamente, videogame não vende mais que sua saúde (câncer).

    Você vai relutar, e pode até dizer que toda a tecnologia digital está por trás de ambas, tanto a bélica quando a de saúde. Aí sim, neste ponto eu posso até concordo. Entretanto, o que ocorre, de fato, é que a informática é utilizada como uma ferramenta, e não como um fim, como ocorre na maioria dos equipamentos de lazer a que você se referia.

    É verdade também quando você diz que não fomos ainda capazes de por um fim ao câncer, mas já avançamos, e muito. É fato que já somos capazes de prolongar a sobrevida dos pacientes, proporcionando nesse meio tempo uma maior qualidade de vida, sem contar que tratamentos como a quimioterapia e a radioterapia tem mostrado uma considerável redução na evolução da doença. Vale ressaltar que comentários semelhantes a estes seus foram ditos acerca da malária e da poliomielite, décadas atrás. Hoje, ambas as doenças estão eliminadas e a OMS (Organização Mundial de Saúde) considera que estas são doenças extintas no planeta.

    Em mais um ponto parece-me que você se equivocou: produtos biodegradáveis. Duvidas mesmo que existam investimentos nessa área? Ora, eles não só tem crescido continuadamente nas últimas décadas como os recursos para pesquisa neste campo têm aumentado vertiginosamente nos últimos anos. Sacolas biodegradáveis, energia geotérmica, casas e asfalto feitos a partir de pneus triturados, créditos de carbono, etc. Tudo isso demanda investimento. Entre dois a dez porcento - variável de acordo com a situação e o PIB de cada país – é alocado em investimentos de pesquisa e extensão.

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  12. Este comentário foi removido pelo autor.

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  13. Ainda Rhuan,

    Achando pouco, volto aqui para discordar quase que em completo do seu parecer quando ao narcotráfico e as favelas.

    Contrariamente ao que você disse, eu afirmo! que o narcotráfico rende pouco. Mentira minha: rende horrores. O ponto em questão é: para quem esse dinheiro vai? Ao que entendi, você diz que ele rende muito para aqueles que ‘o deixam acontecer’, isso parece-me uma inverdade. É sabido que a maior parte da ‘receita’ fica em posse dos ‘investidores’ deste mercado. Enquanto uma pequena fração apenas é repassada para aqueles que fazem ‘vistas grossas’. Reafirmo, apesar da enorme quantia movimentada, os ‘beneficiados pelo silêncio’ são poucos, assim como também recebem pouco para permanecer como estavam, calados. O rendimento do narcotráfico para estes existe sim, é claro, mas não diria que “rende tão bem”.

    E porque diabos eles não legalizam e liberam de uma vez o mercado a suas próprias leis?

    Há quem defenda, como eu, que somente não se legalizou as drogas ainda porque firmar oligopólios de mercado é trabalhoso, e neste momento há algumas dificuldades em específico. Além de demandar investimentos que poucos além dos próprios traficantes tem por agora, eles já conhecem o mercado de longa data. Disputar com ‘o criador do jogo’ seria precipitado, neste momento. Mas a liberação do consumo eu acredito que já tenha sido um passo.

    E outra: nenhum governo deseja que seus favelados continuem favelados! De onde tirou isso?

    A classe baixa (onde se enquadram os favelados) consome muito pouco do que produzem, por não terem condições financeiras de fazê-lo. Enquanto isso, do outro lado da balança, a classe alta (os verdadeiros burgueses – donos) consome muito pouco do que angariam, e a explicação é simples: somam em suas contas quantias superiores ao que gastam, acumulando dinheiro em poupanças ou fundos de investimento.

    Perceba, assim, que é a classe média (genericamente nos colocarei aqui) quem movimenta a economia, que caminha ao lado do Estado, este com as mãos semi-atadas pela primeira. Na medida de suas possibilidades, o Estado tem a maior das intenções de transformar a maior parcela de sua população em classe média, que são os que realmente consomem os produtos que eles mesmos produzem, aumentando o PIB e sua arrecadação. Logicamente, tentar manter os favelados como tal seria uma política frustrada. Mesmo que você me venha dizer que eles prezam por baixos salários ou uma mão-de-obra de reserva, esta parcela não interessa ao estado mais do que uma classe consumista e ativa.

    A dificuldade em transformar todos nessa ‘classe consumista’ é que não se poderiam despejar rios de dinheiro nessa população. Principalmente porque o consumo seria deliberadamente estimulado. Haveria um superaquecimento da economia, seguida de queda acentuada (acredito que algo semelhante a 29, com um pouco menos de especulação). Sem contar que a moeda nacional iria à bancarrota com tanto dinheiro circulando. Queda da bolsa, a inflação em ascensão - Economia é um mundo de ‘montanhas russas’.

    Por último,
    Conhecimento sem aplicabilidade definitivamente não existe. É verdade. Não fomos forçados a aprender desde o colégio os ‘períodos da pré-história’ ou ‘fórmulas de como achar a determinante da inversa de uma matriz de ordem três’. Também nunca decoramos o que é um ‘benzeno’, tampouco quantos planetas há na Via Láctea e como ‘Kepler’ descrevia seus movimentos...

    Conhecimento sem por que realmente não existe? Acredito que sim. O detalhe é o foco que ter-se-á daí por diante. Saber da tecnologia da irrigação que os Incas usavam não me é útil. Por outro lado, as técnicas de mumificação utilizadas pelos egípcios ainda hoje é pesquisada e replicada. O que quero dizer é que seu desinteresse não prova a inutilidade de um dado conhecimento, ainda que ela possa ser momentaneamente inútil, ou mesmo não tão bem compreendido.

    Desculpe-me pelo extenso comentário, Rhuan, é que eu não costumo assistir a novela das oito.

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  14. Ultimamente tenho me comportado, neste blog, como um profeta dos temas epistemológicos da ciência (minúsculo com ênfase, espero ter a oportunidade de explicar este pormenor outra hora). O exemplo laboratorial de Diego bastante me alegra, mas não o vejo como uma assertiva contraria ao meu argumento (ainda pouco desenvolvido). Parece-me pouco afirmar que os cientistas, ou seja, as pessoas circunscritas em um corpo de matéria, com família, hipoteca e cachorro, não estejam em suas praticas diárias constrangidas pela dinâmica do capital. Ora! Seria tolo afirmar que a pesquisa de Rutherford visava a Bomba. Este é o problema das conclusões a posteriori, entretanto, hoje, por mais que haja ainda bastante espaço para a inventividade e as externalidades do processo criativo – Viagra e Futeboleno, por exemplo – a regra se constitui, a partir de um foco probabilístico, na obtenção de resultado. Disto não tenho duvidas, por mais numerosos que sejam os exemplos contrários aqui mostrados, todos se afogam no oceano ordinário da prática cientifica.

    Escreverei um texto sobre isso, se Deus quiser. Mas resumindo: temos duas ciências que se relacionam, não com dois mercados, mas com duas formas de políticas (mercado e política se confundem aqui, mas tem suas especificidades e aproximações). A primeira ciência, aquela debatida entre Sócrates e Cálicles no imaginário fértil de Platão é a ciência que herdamos dos modernos, me refiro ao povo constituinte do tecido sócio histórico depois do renascimento (como é chamado pelo livro de historia). Esta ciência tem por único fim calar a boca-loca da demos (povão). Quando não há leis, o poder esmaga a minoria; e lembre-se, reis, ricos e bacanas são sempre minoria. Qual o objetivo desta ciência então? Produzir a realidade legitima da qual se retiram as leis naturais inumanas e com as quais se opera o processo de decantação do poder das massas. È bastante simples, construir uma realidade a-historica separada da sociedade humana. Daí o famoso binômio Natureza-Sociedade, Leis Naturais-Cultura, Objeto-Sujeito. Isto é discurso, a realidade também é discurso arregimentado na construção do fato natural, se é bom ou ruim é outra historia. Não quero dizer que ciência é balela, o que reafirmo é que esta ciência, fundada para legitimar a segregação como ordem natural dos homens, sufoca o potencial mais áureo de outra Ciência – a qual Diego se remete quando apela pro Viagra. Esta outra Ciência, capaz de dar acesso e socializar, através do experimento, componentes não-humanos – me refiro a prótons, príons e ecossistemas – me parece ser o caminho livre, para cientistas e para cidadãos. Aquela ciência obstinada na produção da realidade e da verdade me parece um discurso muitíssimo perigoso.

    Por fim, hoje, política e ciência mutuamente se colonizaram, se degeneraram. Nem é possível esta outra Ciência, que deixa os cientistas mais livres, nem é possível uma política republicana na Àgora, a técnica fagocitou o discurso consensual, nos restou apenas a verdade dos outros.

    Sobe favelas, narcóticos e novelas, vamos nos cuidar para não cairmos numa sociologia meramente erudita, na opinião que trazemos de casa.

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  15. Estes comentários de Dieguinho estão uma beleza. Tá devendo um texto.

    De qualquer forma, mesmo que os videogames realmente rendessem mais, eu imagino porque El Dom Rhuan fez esta relação entre Nintendo e câncer. Dia desses li um livro de matemática que comentava as modificações que fazemos naturalmente para alterar a lógica ao nosso pensamento. Quando as opções são incontáveis, tendemos a afunilar, reduzir, mesmo a simplificar, algumas delas para que possamos ao menos compreendê-las. E o mundo inteiro, de tudo quanto é jeito, é opção, é matéria prima para investimentos. De laboratórios a videogames, de puteiros a padarias. Se perguntar por que a Nintendo não investe em câncer é o mesmo que se perguntar por que o Real Madrid não investe em controles sem fio. Bem, opções foram feitas. Economicamente falando, não há como dizer que a Nintendo ou o Real estão investindo mal, já que ambos geram lucros. Mas até onde eu vi, o Play II vende mais e o Barça que foi campeão (!!!). Poderiam de ter investido de modo diferente, o que provavelmente geraria mais lucro ainda, mas dentre opções que já foram limitadas ao escolher uma área específica. Para o investidor financeiro, o fim é o mesmo, mas as variáveis são diferentes. Contar todas está fora de questão. Questioná-las, de vez em quando, como fez o próprio Mofino (não li os comentários dele).

    P.S. Futeboleno é um nome de lascar.

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  16. Quando li o texto de Rodolfo estava viajando numa vibe completamente diferente da de Rhuan e Dieguinho.
    Estava pensando sobre a redução cientificista das realidades; sobre a fé que colocamos nas produções científicas, que nunca são separadas da geração de capital.
    Pensei sobre: será que o que é mais verdadeiro é o que recebe mais patrocínio? o que foi produzido por aquele cara que ano passado saiu nessa ou naquela revista científica de nome?
    O que é mais verdadeiro é o que gera mais lucro.
    Eu tomo certos remédios que fazem passar minha dor de cabeça, mas ás vezes me dá dor no estômago. Mas ninguém nunca me ofereceu um remédio assim: Toma, ele dá dor de estômago.
    Eu não sei se fui clara, mas é que alguns pontos são mais valorizados que outros, por isso mais "verdadeiros". E são valorizados por sua utilidade. Mas utilidade é tão relativo...
    Reduzimos tudo que achamos útil ao que gera lucro. A tese de Ju era boa, nós sabemos que era, mas não foi aceita. Algumas curas de câncer (claro que estou levantando hipóteses) podem ser boas também, mas não são aceitas por não darem lucro. Ou talvez porque o cientista nunca tenha publicado nada em revista nenhuma, e talvez não tenha publicado porque o artigo foi mal escrito...

    A ciência pode ser até poética, mas a necessidade de produção de capital sufoca qualquer beleza que possa exitir na estrada que busca desvendar a inatingível realidade.

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  17. ao contrario de todos, eu nem li o texto e nem vou comentar deste tamanho. Mas o blog tah bom. kkkk

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  18. Engraçado é quando a ciência viaja em sua metamorfose inquietante e se transforma numa bela igreja, onde a contestação é proibida! E quem o fizer, é calado

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  19. Anônimo,

    uma ciência cuja contestação racional é proibida não pode ser considerada ciência. O pressuposto da ciência não é validar teses, mas, ao contrário, invalidá-las através da razão, de evidências e de experimentos.

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  20. Eu quero ver alguém destrinchar essa selva de argumentos eruditos e transformá-lo em um texto legível e coerente. Todo mundo se intimida diante de um texto desses. Ninguém está entendendo nada, apenas fingindo. Desfazer esse novelo é tarefa para....quem? Escolham.
    Só para lembrar, estava-se pesquisando um remédio para combater a pressão alta e de repente se deram conta de que o mesmo acabava com a impotência. E assim nasceu o Viagra. As descobertas feitas por acidente abundam na ciência.

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  21. Descobertas científicas feitas por acidente?
    Vamos com calma. Fica parecendo que é aleatório!

    Pênis ficam eretos por causa do aumento da circulação sanguínea. E "pesquisando um remédio para combater a pressão alta" foi maneira genérica de dizer que estavam estudando compostos nitratos combinados com Glicerol: nitroglicerina. Que libera no corpo humano a molécula simples ócido nítrico (NO), que é responsável por efeito de dilatação dos vasos sanguíneos.

    Já que era de conhecimento científico que nitroglicerina podia dilatar vasos sanguíneos, ela começou a ser prescrita para a doença cardíaca conhecida como angina do peito. Testes com a substância para dilatar vasos sanguíneos, no entanto, conduziram a um sub-produto que se mostraria importantíssimo para a indústria farmacêutica: o Viagra.

    "Acidente" faz parecer que o resultado da ciência teria sido não-racional. E foi exatamente o contrário!

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